quinta-feira, 12 de julho de 2012

Soneto da Colheita



Semeado o grão na lavra da inocência,
No bom cuidado a tudo o que amamos
Atapetado o chão com verdes ramos
Preciso é esperar sem muita urgência...

Pois tudo o que plantamos na querência
Apostas são da vida que almejamos,
Mas pra sanear da fome os seus reclamos
Precisa ter, mais que vigor, tenência.

Semente, chuva e sol, arada a terra
O sonho da colheita manifesta
O dom da vida e a paz a que se aferra;

Murmúrios da algazarra que protesta
Que tudo o que é promessa a noite encerra
Desfaz-se o que era breu, pois tudo é festa!


Francisco Settineri.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Fascinado



Deixada a dor pra trás, só na lembrança
De esquecimento toda te vestiste
Mas não sei mais então se a paz resiste
Enquanto o sol se põe e a noite avança...

Pois cedo no compasso desta dança
Eu vi da flor o vaso que partiste;
Os véus de que se cobrem o que é triste
Escuros mantos são do que não cansa.

Noutro cenário eu te diria bela
Cansada, eu sei, por este tenso fardo
Mas abres para mim tua janela,

E eu fico como louco, deslumbrado
Ao ver como se sopra inflada vela
Nas lavras deste leito imaculado!


Francisco Settineri

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Soneto da Purificação



Lavado em pura água cristalina
O rosto que impecável já se inflama,
Se um mar de resplendor o amor reclama
Eu sinto o deslumbrar, rosa menina.

Varrida da memória a velha trama,
Ter sempre um claro alvor a vida ensina,
Trilhar de novo a via peregrina
Mas nunca ver na pele marca e drama...

A luz do teu olhar rebrilha à toa,
Filtrada nos vitrais que se demoram
Em retirar da asa que revoa

As nódoas que pretéritas imploram:
Silêncio no meu céu, não mais ecoa
A voz sem vez dos véus que já se foram...


Francisco Settineri.

domingo, 8 de julho de 2012

Porcelana e Vulcão


Eu tomo as tuas mãos por entre as minhas
E o frio que as enregela vai embora
Não sei como puderam, a vida afora
Mover-se, emudecidas, tão sozinhas...

E o teu sorriso, quando te avizinhas
Me diz que hoje, enfim, chegada a hora,
Marcada pela angústia da demora
Devo escrever pra ti algumas linhas.

Não julgo o teu pedido impertinente
E o beijo tão guardado que quiseras
É verso engalanado de brilhante,

Silêncio de um torpor de mil esperas:
Cansada está de ser de mim distante
A fúria de um calor de muitas eras!


Francisco Settineri.

sábado, 7 de julho de 2012

Rosa Branca



Eu vago a relembrar o sobressalto
No vão de luz que na memória espreita
E atravessar o vão da porta estreita,
Quebrar à força o céu, esse cobalto.

Tomado eu fui assim, no grande assalto
De ver em tua face satisfeita
O ardor que se consome em paz perfeita
E segue na fumaça até o alto....

Invade o cais do corpo a descoberta,
Pois hoje o teu temor retira a tranca
Do coração que aguarda em hora incerta:

A porta dos teus lábios, livre e franca
Despede uma palavra entreaberta,
Timbrada de manhã a rosa branca!


Francisco Settineri.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Ocaso da Fada



A lua se apagou por um instante
Nas tramas desse triste pôr-do-sol
E o saxofone denso em tom bemol
Trazia uma lembrança tão distante...

A estrela desse quadro dissonante
Brilhava desde então como um farol
E eras para mim como o escol
Diáfana, audaz, tão elegante!

Mas ver que a dor de ser te fez cansada
Pois que deixaste a névoa e nela o cio
Não faz com que tu deixes de ser fada

Nas matas do meu mito em desvario.
Tu és o infinito do meu nada
Tomado na volúpia do vazio...


Francisco Settineri.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Liturgias


 
No cais do amanhecer te fazes outra
Nas páginas de cor da vida inteira
Marcada pelo molde de uma letra
Tomada então no abismo à sua beira...

Repetes para mim sempre o teu mantra
E a paz do teu dizer nunca é ligeira,
Comanda a liturgia do teu tantra:
Como pensar em ti de outra maneira?

Renasce, então, pra mim, na tua prece
O astro que se mostra sem engano.
Recolho o amor em flor que se oferece

Nas pedras de um império soberano:
Eterna solidez de um alicerce
No altar desse meu templo tão profano!


Francisco Settineri.

O SOM DO SILÊNCIO

.   Fim da tarde, o sol se esconde, E, por fim, a lava escorre Deste Etna que não morre, E que vai não sabe onde... . O fogo parece fronde. ...